O guia para sobreviver (e mandar bem) pedalando em altitude

Texto: Anaísa Marques
Fotos: Cesar Delong

Enquanto os efeitos da altitude no organismo são bem sérios, alguns recursos nutricionais podem ser usados a favor do atleta para melhor adaptação e a performance nessas condições

Muitos atletas de resistência buscam treinar em altitude para estimular o corpo a melhorar o desempenho ao nível do mar. Outros, tem como meta a realização de provas ou cicloviagens em altitudes nas quais nunca foram expostos antes. Seja qual for o objetivo, pedalar em altitude impõe um estresse grande ao corpo. Recursos nutricionais podem ajudar a contornar alguns problemas comuns e melhorar a adaptação e o desempenho nesses eventos.

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Disponibilidade de energia e ingestão de carboidratos

Em altitudes elevadas, o gasto energético aumenta drasticamente – é até 5 vezes maior do que ao nível do mar – e por isso é essencial obter energia suficiente para atender às demandas energéticas totais do organismo. Essa demanda aumenta tanto durante a atividade física, quanto depois, portanto é necessário um aporte calórico maior.

Quando não se consome calorias suficientes, principalmente sob as condições de uma prova ou evento em altitude, o sistema imunológico pode ser comprometido, lesões se tornam mais frequentes e a aclimatação fica mais difícil. Além disso, hormônios sexuais podem ser suprimidos, prejudicando as adaptações do sangue à altitude, pois o metabolismo do ferro e a composição das hemácias estão diretamente relacionados a esses hormônios.

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O recomendado é que, a partir dos 2000m, os atletas sigam uma dieta rica em carboidratos (aproximadamente 12g/kg). Alguns estudos mostraram que o consumo de carboidratos 40 minutos antes da exposição à hipóxia aumenta a ventilação e saturação de oxigênio, o que alivia alguns dos impactos negativos de altitude elevada e pode melhorar a performance. Outra vantagem é que carboidratos usam menos oxigênio quando comparados a gorduras e proteínas para a geração de energia. São um combustível mais “econômico” para o corpo que já está sobrecarregado com exercício extenuante e ar rarefeito.

Durante e imediatamente após o exercício, devem ser consumidos produtos com carboidratos de alto índice glicêmico para otimizar a ressíntese de glicogênio muscular. Recomenda-se que os ciclistas consumam de 1,37 a 1,72 g de carboidratos por kg corporal nas primeiras 4 horas após o exercício. Considerando que a altitude pode levar a inapetência e náusea, parte desses carboidratos podem ser consumidos na forma de suplementos líquidos.

Ferro

O status do ferro merece particular atenção antes da exposição à altitude. Afim de compensar o ar rarefeito, o corpo formará novas células vermelhas no sangue para aumentar a oxigenação dos tecidos. Essas células vermelhas, as hemácias, contém hemoglobina, uma metaloproteína com ferro na composição. Mais hemácias sendo produzidas resultam em um declínio na quantidade de ferro do sangue. É recomendando avaliar o status do ferro de 8 a 10 semanas antes do treinamento em altitude, para começar suplementação oral 2 a 3 semanas antes da viagem, se necessário, e continuar essa suplementação durante o período no qual o atleta estiver em altitude. Sugerimos o envolvimento de um médico nesse processo: a suplementação excessiva e estoques endógenos elevados de ferro podem ter efeitos deletérios.

Hidratação

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Hidratação adequada é um fator-chave para o desempenho. A hipóxia e a baixa umidade do ar de lugares muito altos tendem a aumentar as perdas de líquidos em repouso e durante o treinamento, principalmente através da respiração. Portanto, os atletas devem monitorar o status de hidratação, por exemplo, observando características da urina e alterações diárias de peso corporal, além de serem proativos com a ingestão de líquidos.

Nitratos/beterraba

O óxido nítrico (NO) é uma molécula de sinalização e um regulador de muitos processos fisiológicos estimulados pela hipóxia. O consumo de beterraba, que é uma fonte de nitrato (NO3, precursor do NO), promove vasodilatação e um aumento (1 a 4%) na saturação de oxigênio durante o exercício, ou seja, melhor distribuição de oxigênio para os tecidos.

Antioxidantes

O exercício em altitude está associado ao aumento exacerbado da produção de espécies reativas de oxigênio e também à capacidade antioxidante reduzida do corpo. Como resultado, há um aumento no estresse oxidativo, que pode causar danos celulares, prejudicando processos metabólicos como aclimatação e recuperação. Dado que antioxidantes exógenos neutralizam os radicais livres, é lógico pensar que a suplementação com antioxidantes seria uma intervenção justa para combater o estresse oxidativo.

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Entretanto, ao mesmo tempo que o estresse oxidativo pode ser danoso, ele também serve para induzir a adaptação ao exercício e altitude. Alguns pesquisadores defendem os efeitos positivos de antioxidantes, como a vitamina C, enquanto outros acreditam que uma dieta rica em vegetais já oferece a quantidade ideal de antioxidantes e que suplementos só devem ser usados quando não se tem acesso à uma dieta natural. Assim, o uso de antioxidantes permanece controverso.

Vitamina D

Sabe-se que existem receptores de vitamina D no coração e em vasos sanguíneos, o que sugere que seu uso pode trazer benefícios cardiovasculares. Há evidências de que a vitamina D na dose de até 4000 UI/dia causa relaxamento vascular e melhora contratilidade das células do coração, o que cria condições fisiológicas favoráveis para o desempenho esportivo. Além disso, a vitamina D é necessária para manutenção da integridade e função estrutural do músculo esquelético.

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Em altitude, a intensidade da radiação UV aumenta, criando condições favoráveis ​​para a síntese de vitamina D (o suplemento é um precursor da vitamina D, ela é sintetizada na pele e não pode ser suplementada na forma final!).

Conclusões

A nutrição pode ser uma grande aliada para otimizar o desempenho esportivo em qualquer situação, principalmente quando o corpo já está sob estresse, como em altitude.

É necessário estar atento ao consumo de alimentos mesmo sem fome, priorizando carboidratos – eles têm um papel essencial na adaptação e na performance;

O status de ferro deve ser avaliado semanas antes da exposição à altitude, pois se estiver baixo, demora para retornar a níveis satisfatórios. É essencial para as adaptações do sangue à altitude;

Não há uma quantidade definida de líquidos para a hidratação ideal, assim, a hidratação deve ser monitorada diariamente através do peso corporal e concentração da urina;

O nitrato presente na beterraba melhora a distribuição de oxigênio para os tecidos;

A suplementação com antioxidantes deve ser considerada quando fontes naturais de alimentos não estão disponíveis;

Suplementação com até 4000 UI/dia de vitamina D pode trazer benefícios cardiovasculares e para a musculatura esquelética, favorecendo a performance.

Texto : Anaísa Marques

Anaísa é veterinária, mestre em biologia animal, triatleta amadora e tem diabetes tipo 1. Ao longo de muitos anos, aprendeu como fazer para o esporte deixar a diabetes mais fácil.

Siga: @everydayimpedalling

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4 Comments

  1. Trek Treacy

    obrigado pelo artigo muito informativo e bem pesquisado e escrito!

  2. Trek Treacy

    Thank you for the very informative and well researched and well written article

  3. Ricardo Otero

    Ótimo artigo !

  4. Cardoso

    Maravilha de matéria.

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